A família de Hassan vivia pacificamente na vila de Tayr Debba, um local habitado por estudiosos e pessoas felizes, até que a paz foi despedaçada por bombardeios intensos de aviões israelenses, forçando-os a deixar tudo para trás. Sem escolha, uniram-se em fuga a centenas de outras famílias em busca de segurança em outras regiões do Líbano, passando pela ponte de Jisr Abu Al-Aswad.
Todos se amontoaram no velho carro da família. Hassan dirigia, enquanto sua esposa, Leila, tentava acalmar as crianças nos bancos traseiros. O som dos bombardeios se aproximava, e o medo estava estampado nos olhos de todos, apertando-lhes o peito. Iniciaram a viagem rumo ao norte, na esperança de alcançar o rio Al-Awali, onde ouviram que havia um caminho seguro.
Mas a jornada rapidamente se transformou em uma espera interminável em meio a um congestionamento. As estradas estavam lotadas com centenas, talvez milhares, de carros, e as pessoas se viam presas, incapazes de avançar. Não havia água, comida, nem sequer um posto de segurança ou apoio militar para facilitar a passagem. As crianças no banco traseiro começaram a sentir a sede e o cansaço. O filho mais velho perguntou baixinho: “Pai, já chegamos? Quero água.” Mas Hassan não tinha uma resposta. Tudo o que pôde fazer foi tentar acalmá-lo com palavras que ele mesmo não acreditava.
As horas passavam lentamente, enquanto outras famílias também esperavam exaustas nas longas filas. Com o tempo, o ressentimento crescia nos corações das pessoas, não só pela catástrofe em si, mas pela ausência das autoridades de segurança e militares que deveriam estar ali para organizar o tráfego e ajudar na saída da população das áreas de perigo. Alguns perguntavam em voz alta: “Onde está o governo? Onde estão os responsáveis? Como podem nos deixar assim, em uma situação tão desumana?”
Mas não havia respostas. As perguntas se dissipavam no ar, assim como as gotas de suor que escorriam das testas das crianças nos bancos traseiros. Leila tentava distrair os filhos com histórias e brincadeiras, mas a sede e o cansaço tornavam qualquer distração inútil.
O rio Al-Awali, que deveria ser o fim do sofrimento, parecia mais distante a cada momento, quase uma miragem. A família percebeu que a jornada não era apenas uma fuga dos bombardeios, mas também uma prova de resistência diante do sofrimento e da negligência das autoridades, que apenas aumentava suas dores.
A estrada estava cheia de raiva contida e de famílias que gritavam em silêncio contra os políticos, que não providenciaram meios para aliviar a pressão sobre o povo, como se todos tivessem sido abandonados à própria sorte, enfrentando a morte ou a sede.
Finalmente, após horas de espera extenuante, a família conseguiu chegar ao rio Al-Awali. Hassan, exausto, abraçou seus filhos e disse: “Conseguimos, meus filhos. Vamos beber e descansar. Ficaremos juntos, aconteça o que acontecer.”
Apesar de todas as dificuldades, a família de Hassan, como tantas outras, saiu dessa jornada mais forte. Mas o ressentimento por aqueles que os deixaram diante do desconhecido, sem oferecer ajuda ou orientação, nunca será esquecido.
Assim continua a vida de deslocamento no sul do Líbano, onde bombardeios e guerras tornam as pessoas mais fortes, mas as perguntas persistem: onde estão aqueles que deveriam nos proteger? E onde estão eles em relação às nossas dores?
Por Dr. Hassan Al-Zein
Traduzido por Amani Abou Hamze